segunda-feira, 27 de março de 2017

Friends

Quando me sinto em cacos, com seus pedaços me faço inteiro.

 Mosaico,
Dos nossos cortes e sortes encaixamos nossa história,
 a parte do todo que sustenta meu próximo eu.

 Entao vivo colecionando essas cores,
 esses menores traços que juntos fazem da vida uma obra de arte.

O final de curso...

Escrito a 10 (mil) anos atras!


--x--x--x--x--x--x--x--x--x--x




E dizem que desde a criação do homem, onde Deus pôde observar o quão distante de suas expectativas sua criatura Lhe saiu, nada diverte mais os filhos Dele do que tentar projetar o futuro. Ainda que ausente na Bíblia, há uma suspeita quase que universal de que os parágrafos entre o sopro no barro e a vitalização da costela foram divididos entre queixas anatômicas da criatura e um jogo de previsões sobre o novo ser, a mulher.
Como efeito dominó de todo esse conturbado começo, estaria a obsessão do mundo em projetar o futuro ainda que o presente seja até mais incerto. Nada melhor então exercitar a nossa observação em falar sobre as projeções de final de faculdade.
A primeira previsão a fazer – que, por obviedade, será a primeira a vir por terra – é a de que todos continuarão a se ver. Até o mais fixo dos mortais, casado, pai de gêmeos e cheio das promissórias da casa própria arranja um primo da esposa, “seu fulano” em uma cidadezinha, para qual ele se enfia, sem entender muito bem toda a distância. Há os que somem por vontade e os que somem por inércia; os que se casam, os que se mudam e os que se cansam; Os perdidos e os largados, contrariando as expectativas, são os mais fáceis de achar, pois de tanto andar, sempre acabam sendo encontrados, numa ponte aérea, numa praia, ou pasme – no casamento daquele seu vizinho mala que só agora veio a se revelar padrinho de Crisma do dito cujo.
Seria muito prudente prever o sucesso: certamente todos estarão felizes ou empregados (não necessariamente felizes e empregados) ainda em janeiro, sem dúvida. Certamente? Bom, peça outra coca-cola... Não é necessário prever que o mais ordinário aluno da sala, dos trabalhos entregue dez minutos antes da hora, feito nos vinte minutos anteriores, será o mais bem sucedido. O sucesso, por regra básica, sabe que o grande segredo da sua chegada se liga às expectativas criadas. Portanto, aquele popular, boa pinta, fluente em inglês, espanhol, russo e javanês, iria considerar o sucesso normal e apenas conseqüência. Esse tipo vai trabalhar com os pais novamente, no comércio de sapatos em Jaú.
Não é preciso apostar que o tempo passará para todos. E com isso, da mesma maneira que aquela magrinha do primeiro ano de faculdade hoje sabe onde sua própria saia aperta, todas as aparências podem mudar. Pulemos o capítulo básico: a coloração dos cabelos das mulheres do grupo. Não espere o mesmo dos cacheados, porque o advento da chapinha fez com que todas as mulheres fiquem com os cabelos lisos. Já não suporto mais a chapinha, mas isso eu discuto depois. Nos homens, é fácil prever – e acertar – o advento do fortalecimento abdominal, vulgo barriguinha. Cabelos vão cair, principalmente porque para eles ainda não existem sutiãs (lembrando que esses últimos nem sempre funcionam adequadamente). Aquela menina feia, chata e gorda agora é só chata e neurótica. A feiúra Pitanguy ajudou, a gordura foi obra da redução de estômago e a chatice, antes resultado da falta de bom sexo, hoje vem pela falta de chocolate (o que comprova que seus efeitos são bastante próximos). E, depois de anos de chatice, a neurose aparece por osmose. Mas se isto lhe servir de consolo, pense que embora as aparências enganem, não há máscara de pepino, floral de Bach ou lipo que aspire de dentro de cada um a essência, já entendida com cinco anos de convivência.
E não pense você que o título, igual para todos, acabará com as eternas brigas de diferentes castas. Os ex colegas de sala combinarão de se encontrar para conversar e, enquanto alguns ainda sugerirão o bom e velho “Espetinho do Seu Garcia”, outros sugerirão “Le Petit Figarô”. Não se importe: a solução é das mais antigas e praticadas dentro de sua vida de graduando, com a divisão “dos amigos” em duas “panelas”, cada uma indo para uma das sugestões. O mais sadio de tudo isso é quem gosta de cabernet, tomará cabernet; E quem gosta de palitar os dentes com o folder de alguma papelaria, o fará, pois afinal, todos estão entre amigos.
Se sua sala fugir às expectativas, os churrascos de reencontro se realizarão. No de 5 anos alguns levarão suas esposas e maridos, outros suas namoradas (os), outros irão sozinhos, de boné, brinco e cabelos compridos (?) e alguns levarão a sua HP ou seu Paulo Coelho. No de dez anos, alguns levarão seus filhos, muitos seus conjugues, alguns suas namoradas e uns últimos sua HP ou seu Paulo Coelho. E, se tudo isso persistir, no de 15 anos, pode ser que alguns dos amigos levem seus netos no colo, que terão o significado dos seus nomes explicados pelo Paulo Coelho e suas taxas de crescimento descritas na HP.
Aliás, esses encontros, assim como quase todos os outros, serão oportunidades únicas de se comparar os ganhos de cada um. Se o encontro é na sua casa e a esposa fresca de seu amigo do CitiBank perguntar onde fica o ofurô, fale a respeito de sua casa na praia, ao menos que entre seus amigos esteja algum que se anime de pedi-la emprestada. Neste caso, fale sobre sua fazenda no Mato Grosso, com 200 mil cabeças de nelore, porém sem uma casinha legal para passar os finais de semana. Se o churrasco for na casa de seu amigo e você se sentir mal em estacionar seu Monza 87 do lado de alguma Mercedez, diga as maravilhas de sua casa, que seria o melhor lugar para os próximos encontros, se não fosse a sua rara criação de dragões de Komodo albinos, uma das únicas duas no mundo, que não podem ser sujeitadas à estresse auditivo. E se um dos amigos faltar consecutivamente pense que ou ele é o que está “mais bem de vida”, ou é o que nem desculpa tem para o poliéster de segunda.
E prevendo, tenha certeza ainda que vá haver os que se descobrirão gays, ou lésbicas, ou ambos. Parte desses dirá que somente agora se descobrirão, outros dirão que agora não encobertam mais. Na prática, isso não importa, lembre-se disso apenas antes de contar quantas pessoas vão comer a rúcula e quantas facas serão necessárias para se comer à mesa.
E da mesma forma que uns encontrarão caminhos alternativos de viver, outros encontrarão o desespero. Este pode chegar cedo, porque tem gente desesperada que quer ser contratado, depois ser promovida, depois ter uma equipe e virar gerente, sem se perguntar se o tempo assim o quer. Há os desesperados por dinheiro, os desesperados por sexo e os desesperados por casamento (encontros fatais entre as duas últimas classes costumam render filhos e casamentos bizarros). Pode ser que no meio de tanto desespero venha a aparecer um suicida. Mas não é bom se prever essas coisas...
Certamente que no meio de tanto desespero, haverá sempre os que encontrarão Deus. Não que Deus não possa ser encontrado em qualquer lugar, afinal ele está em toda parte e tudo vê (ops, acho que confundi com o Big Brother Brasil N), mas é que, impressionantemente, contrariando qualquer expectativa de São Longuinho, é muito mais fácil achar Deus quando se está desesperado. Entre esses que encontrarão Deus, uns largarão a bebida, outros rezarão de acordo com o que se prega e outros ainda serão pacientes com os outros (esse último requer extrema dedicação...). Mas sem precisar de muitos dons de previsão, dá pra sacar que parte dos que encontrarão Deus continuarão a se encontrar com suas amantes, a cortar a fila da vovozinha no banco e coisas afins.
Mas sinceramente meu amigo leitor, não há previsão que resista a uma boa ação. Isso só quer dizer que se as perspectivas lhe parecessem ruins, arregace as suas mangas e mostre que é capaz. A faculdade pode acabar, mas as amizades e a felicidade só diminuirão se nada for feito pelo contrário. Sinta-se fraco como um homem, que sabendo de suas limitações, se esforça o suficiente para vencer as mais tristes das previsões; e seja confiante como um Deus, que mesmo depois de criar o homem, viu razões para se arriscar e criar a mulher. Certamente algo saiu diferente do que Ele esperava... pois previsões servem para isso – falhar! O quanto? Bom, isso depende de cada um de nós...

Buraco Negro

No começo dos tempos,
Eu estava assim sei lá, correndo solto,
propulsão orbital,
Viajando a zilhões de quilômetros por segundo.


De contar o tempo e de cortar espaços,
abrindo marcos e registrando ferozmente as andanças
vivia escravo da velocidade, sem emergência ou gravidade


Passei por um buraco negro.


Deformada realidade, não agora mas antes
Capturado pela densidade,
“Decifra-me ou devoro-te”


A corrida virou espera e a energia virou materia
Um nada, meu tudo Engolido. Fusão.
Um campo novo, 1+1=1


E esse um é bom, porque é cheio
E engolido me sinto bem
A gente não precisa caminhar, só se fundir


Perdi o relógio, perdi a pressa, correr cansa,
procurar tortura a mente
as vezes ainda me pego olhando pro pulso onde antes havia o timer


Ah, sei lá, buraco negro
Por que ficar medindo o tempo,
Se já sei que ao seu lado você faz o tempo parar?